Venho de um deserto
tão vasto, de mãos grossas , pernas finas
e olhos fundos.
Sou sombra do que fui na fartura
sou a morte que vaga nos ossos.
Que acompanha o negrume das asas dos urubus
que circundam alto o cemitério de onde eu nasci.
Na sede que jorra da seca,
se esvazia oca a boca, a língua e a pele
queimada ao sol.
A fartura que te acompanha agora é ausência muita,
como se a água faltasse a boca na hora de beber.
É o sol tua fartura, é o espinho enigma que se faz em cruz na morte.
É uma solidão funda no estômago.
É o chão rasgado, costurado e que nada te dar em troca.
É a humilhação do semblante da testa forte que se dobra
aos prédios cinzas.
É por fim a morte que vem misturada com calor, sal e terra.
Mas continuas a viagem pois não podes parar.
E a ausência que tens muita ainda assim é pouca.
A lápide para a tua carne é quase nada, é sertão de nevoa , o pé descalço abrupto que anda imensidades sem fim. Escarlate sangue e veias soltas balbuciantes de sofrimento alheio. Uma morte tão consciente de si que mas parece uma vida que acaba de nascer.